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31-01-2009

Velhos juvenis e jovens não senis

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Uma guerra ruidosa e tão antiga quanto a humanidade se trava entre jovens e velhos. Os jovens, que só não são mais impiedosos e sádicos do que as crianças, ainda sem a percepção de que a juventude passa mais rápido do que cílios se trançam e destrançam, gostam de chamar os mais velhos de coroas, de realçar-lhes as rugas, a decrepitude, a caretice, as endurecidas juntas. Os velhos, tentando não ver que às vezes se amadurece, outras se apodrece, gostam de falar em condescendência no fundo arrogante, de balançar a cabeça dizendo pirralho, mal saiu dos cueiros, da vida nada sabe, devia aceitar um conselho e de sabedoria nomeiam suas desesperanças.
Os jovens jogam na cara a coragem, o entusiasmo, dizem que é preciso curtir a vida adoidado, ficar antenado com as mudanças. Os velhos apreciam dizer que no seu tempo era assim e assado, e que de outro modo pensariam os imberbes se tivessem experiência e aprendizado. Mas é curioso que se necessitam e quando esbarram, hasteiam a bandeira provisória de uma paz falsamente branca.
Homens velhos gostam de casar e perseguir mulheres jovens, não só porque são atraentes, mas porque desse modo exibem o troféu de potentes. E muitas mulheres ligam-se a eles, não só porque segurança sentem, mas porque dão a juventude como um presente. Um dar que é menos dádiva do que barganha. A juventude lhes confere certa superioridade, porque no mais se sentem só uma costela ou a metade de um homem. Porque quando envelhecerem, serão descartadas e isso ninguém aguenta, um bagaço de cana chupado, o pavor de por duas de vinte ser trocada a companheira de quarenta.
Uniões desiguais são então uma forma de assegurar-se. E sentindo-se tão fracas, na impotência de vencer tradições e preconceitos ancestrais, encaram-se jovens e velhas como ferozes rivais. Entredevoram-se. Como gostam de dizer as jovens, ao contemplar um casal da mesma idade: a mulher parece mais acabada. Que secreta satisfação experimentam ao saber que a rival é bem mais adiantada no tempo.
E atualmente, as mulheres, que gostam e podem igualar-se aos homens, também ostentam, poderosas e importantes, jovens como maridos ou amantes. Sabem, porém, que sua felicidade é mais frágil e mais precária, que é preciso exibir boa plástica, boa conta bancária, e que todos, tanto velhos, quanto jovens, estão por aí a agourá-las. Uma hora serão trocadas – dizem os sádicos, os que alimentam rivalidades entre sexos e idades.
Quem dera todas essas questões e disputas fossem irrelevantes. São pura bobagem. Porque o amor transcende e as almas não têm idade. Provêm, aliás, de antiguidades. Há, felizmente, jovens não senis e velhos juvenis, com olhos e corações espontâneos, curiosos, que não se interessam apenas pela embalagem, que já nascem ou se tornam realmente sábios, sabendo-se ignorantes e portanto sempre prontos ao encontro e ao aprendizado. Esses formam em paz lindos casais ou sólidas amizades de 18 e 81 anos.

13-11-2008

BLOGAGENS

Para não dizer que não falei da grama

Ao realizar hoje uma caminhada pelo Parque Vaca Brava, mais uma vez fui abordada por algumas garotas - pareceram-me estudantes - oferecendo panfletos que eu, naturalmente, recusei. Por mais que eu goste de ler, não posso e não costumo - minha coordenação motora de "gauche" não permite - assoviar e chupar cana ao mesmo tempo ou caminhar e ler simultaneamente. Além do mais, panfletos não são exatamente minha leitura preferida. O que quer que aquelas garotas estivessem oferecendo: convite irresistível para algum lançamento imobiliário ou intimação à minha consciência para participar de alguma campanha para doação de sangue, estavam oferecendo no momento errado, no lugar errado.
Não compreendo como essas empresas especializadas na distribuição de panfletos não percebem que parques onde pessoas realizam caminhadas ou corridas estão longe de ser o lugar ideal para entregar esse tipo de material. A maioria das pessoas vai ali para se exercitar e para isso precisa estar com as mãos e a cabeça livres. Vejo que muitas aceitam os panfletos a contragosto e se livram deles na primeira oportunidade, freqüentemente descartando-os na própria grama ou pista de caminhada. É mais lixo nas ruas, mais lixo para os garis recolherem ou para entupir os bueiros.
Aliás, questiono mesmo a eficiência desses panfletos como instrumentos de marketing. Será que as vendas compensam tanto papel gasto? Eu continuo a achá-los incômodos, desnecessários e ineficazes. Não me lembro jamais de ter saído à compra de algum produto assim anunciado. E também não me conformo com a distribuição nos semáforos. Por acaso revogaram a lei que proibía a abordagem dos motoristas ou, passada a safra de reportagens na TV, ela foi simplesmente esquecida?
Hoje, particularmente, tive vontade de escrever sobre isso porque as garotas que estavam distribuindo os panfletos pareciam cumprir alguma tarefa escolar. Vestiam camisetas iguais - confesso que não li o que estava escrito nelas - e tiravam fotos. E não foi a primeira vez que vi outros grupos agindo da mesma forma. Imaginei que se tratasse, por exemplo, de um trabalho para a aula de história, português ou geografia. "Invente uma forma criativa de mobilizar as pessoas a respeito de algum tema, como a importância da doação de sangue.". E lá foram as estudantes reproduzir comportamentos sem questioná-los, com o aplauso e consetimento da escola. Não sei se foi isso que ocorreu de fato, mas deixo aqui registrado o meu desagrado. Assim é que pessoas e escolas vão vivendo no piloto automático.
E para não dizer que minhas caminhadas só rendem resmungos, hoje também vi algo no parque que me chamou a atenção de forma positiva. Os trabalhadores do setor de parques e jardins da Prefeitura estavam cortando a grama com aquelas maquininhas barulhentas. Como trabalhavam em área próxima à rua, usavam telinhas de proteção, para evitar que algum resíduo, como pedras, que geralmente escapam daquelas máquinas, atingissem alguém, no parque ou mesmo dentro dos carros. Eu mesma, há algum tempo, quando passava de carro perto de uma dessas máquinas, já levei uma pedrada na testa. Por sorte foi na testa e não no olho, mas sempre me ocorreu que algum dia essa atividade, aparentemente tão inofensiva, poderia causar um dano mais sério a alguém. Finalmente a Prefeitura se deu conta desse risco e tomou uma medida simples, mas certamente eficiente.

21-08-2008

Oração de mãe

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Epígrafe:

Em amor e prece
não se põe preço

A gente sonha pro filho
tudo o que de bonito vê nos livros.
A gente sonha que ele seja um livre pensador.
Mas a gente sonha sobretudo
que ele seja livre.
Livre para ganhar o pão
da carne,
sem o diabo amassá-lo
e do espírito,
sem que seja partido em dor
como Cristo.

Mas que Deus o livre
de nosso próprio amor,
armador de grilhões,
chantagista,
do que faz refém:
"mamãe te ama
como não amará ninguém".
Pois a que diz:
"por ti tudo sacrifiquei e fiz"
é a que tranca no ninho,
a do voar não pode,
a que deve a fama Freud.

Dizem que uma mãe
acerta
mesmo quando erra
ou que se erra
o faz na melhor das intenções.
Mas Deus livre os filhos e o inferno
das nossas culpas de mães,
dos nossos rosários de dores e lamentações,
dos joelhos reclamões
de preces e martírios,
dos juros exorbitantes pelas noites mal dormidas,
da eterna ladainha
de Eva punida,
do véu hipócrita
da virgem imaculada que concebeu
e inconcebível.

Deus nos faça lembrar sempre:
ser mãe é antes de tudo um generoso
ato de egoísmo.
E a maternidade consentida
é antes um dar-se prazer e vida.
E o padecer no paraíso
– não nos esqueçamos nunca disso –
foi um padecer e um ser escolhido.

***********

Devo confessar,
ao me tornar mãe,
reaprendi a rezar.
Achei novo porquê de ser cristã.
Mas, Deus,
livrai meu filho de meu próprio mel
e mal.
E a mim,
que eu me mantenha sã!