07-08-2007
O fabuloso mundo das calcinhas
Fabuloso e injustamente explorado o mundo das calcinhas. Nunca ganharam uma campanha publicitária, como aquela célebre: “o primeiro sutiã a gente nunca esquece”. Naturalmente, pois, afinal, qual de nós se lembra da primeira calcinha? Éramos pouco mais do que um molde de gente, quando as fraldas foram substituídas por elas. Vamos fazer-lhes justiça. Podemos nos vestir como verdadeiros caminhoneiros, mas ali por baixo de nossa armadura, ela reinará: a calcinha, nossa marca, exclusivamente feminina. Nossa identidade.
A lembrança mais remota de que tenho de uma calcinha em minha vida era daquelas com as quais costumava se embonecar as meninas, no tempo em que, para o bem e o mal de bonecas, devíamos trajar cores suaves, bordadinhos, babadinhos e saias bufantes – e não as roupas de mulheres em miniatura de hoje. Tinha rendas no bumbum e com ela vivi um divertido episódio da infância na fazenda, de que me recordo mais pela imaginação do que pela memória.
Minha mãe e irmã, para se divertir às custas da minha pequenez, estumavam o vira-lata atrás de mim. Parecia enorme a distância entre a varanda da casa e a porteira. Eu corria, o cachorro disparado atrás. E quando finalmente, com minhas pernocas curtas, alcançava as primeiras tábuas da porteira, o cãozinho já estava lá dependurado nas rendas, rosnando. Eu abria um só berreiro.
Mas, exceto por esse episódio, nunca tinha reparado muito nelas, não lhes dava mais atenção do que às meias. Usava o que minha mãe me comprava, sem ligar a cores ou modelos. Apenas tomava o cuidado de não usar uma calcinha furada quando saía de casa, pois, como ela dizia, a gente nunca sabe o que pode acontecer. De repente, tem uma sapituca no meio da rua e fica com os fundos de fora. E ainda, quando vestia roupa nova e calcinha velha, ela advertia: por fora, bela viola, por dentro, pão bolorento – ditado que servia também para nos ensinar o cuidado com nossa higiene pessoal e nossos sentimentos.
A chegada da adolescência coincidiu com uma importante descoberta, propiciada por uma prima mais velha, moça feita. Foi ela a responsável por ingressar num novo mundo, em que as calcinhas deixaram de ser apenas uma peça de vestuário, para ser promovidas a signos. Dizia-me a prima que em uma casa onde houvesse moças solteiras, era bom ter sempre dependurada no banheiro uma calcinha preta ou vermelha. Onde já se viu isso?! Mais tarde eu aprenderia que esse hábito é não só mau gosto ou má educação, como calcinhas pretas e vermelhas podem ser mesmo um indício de outra coisa.
Aprendi também que não apenas as cores têm variados significados. Modelos e tecidos dizem muito sobre suas donas e intenções. Calcinhas de malha de algodão, confortáveis, recomendadas pelos ginecologistas; calçolas da vovó, que alcançam a linha da cintura; as de lycra; as rendadas; as fio dental; as comestíveis. Situações envolvendo esses modelos tornam-se muitas vezes verdadeiras anedotas. É clássica, por exemplo, a situação em que a moça, para resistir a ir para a cama com o rapaz em um encontro, usa o paradoxo de uma calcinha gigante. Não resiste, porém, e passa o maior vexame. São bastantes conhecidos também os casos em que não são usadas. Mas este já o fantástico mundo das sem calcinha. Assunto para outra crônica. Ou para revistas de celebridades.
Bunda rica!!!
P.S: Ao pesquisar imagens de calcinhas na internet, encontrei, em um site de vendas de roupas íntimas, a imagem de uma calcinha muito parecida com aquelas que usávamos na infância. Descobri que o nome desse modelo, cheio de rendinhas, é bunda rica. Que modelo será então o de uma calcinha bunda pobre?
16:45 | Permalink | Comentários (3)
Comentários
Nossa, você escreve MUITO bem. Parabéns Cássia!
Escrito por: Leonardo | 09-08-2007
Adorei as lembrancas tambem que passaram por minha cabeca.
Super divirtida, gostei da foto da abelhuda.
Fou ficar por fora do flickr por um tempo....
A forca da palavra as vezes feri, e um dos meus contatos ficou injuriado comigo, talvez porque nao leu a primeira foto da Eliana, talvez, nao fale ingles, sei la....
Mas olharei suas fotos, e seus lindos poemas.
Ai mando um abraco a voce e familia.
Legal, o anchieta e um lugar legal pra viver, e acho que os unformes azuis eram do instituto de educacao...
Abracos.
Escrito por: max tuta | 10-08-2007
Acho que as "bunda pobre" devem ser aquelas feitas de sacos de estopa... aquelas das piadas de "ração para pinto", sabe quais?
[]'s
Escrito por: Caroline Montagner | 29-08-2007
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